Inflação, guerra e políticos

Adoro ver os fiduciários a publicarem dados, na qual desmente declarações ou atitudes dos próprios fiduciários no passado.

Quando estávamos em plena crise inflacionista, os políticos e economistas correram para as televisões e jornais a atribuir a responsabilidade da inflação,  em exclusividade, à guerra da Ucrânia.

«A invasão da Ucrânia pela Rússia, há dois anos, alimentou uma escalada dos preços do gás natural e da eletricidade na Europa, e o disparo da inflação para níveis históricos.» – Expresso

Mas antes de começar a guerra, a inflação(IPC) estava nos 5.3%, já em máximos históricos.

É claro que a guerra contribuiu para a subida de preço, mas não foi a principal razão.

A subida generalizada de preços, vulga inflação, pode acontecer por dois fatores distintos.

Ruptura na cadeia de abastecimento

Quando existe uma ruptura na cadeia de abastecimento, ou seja, um problema na oferta ou na demanda. 

A guerra provocou uma ruptura na oferta, sobretudo na energia e nos cereais. Na pandemia houve uma ruptura na demanda, nas máscaras e no álcool gel.

Só que este tipo de inflação é temporária, de curto prazo, a longo prazo acaba por corrigir. Têm um impacto inicial, o preço dos produtos sobem rapidamente, depois a indústria ajusta-se e os preços acabam por corrigir.

Inflação monetária 

Ao contrário da ruptura da cadeia de abastecimento que é temporária, a inflação monetária é persistente, nunca mais volta aos valores anteriores.

Esta inflação é gerada pelo bancos centrais ou bancos comerciais, através de políticas que aumentam a base monetária, para os leigos, os bancos imprimem dinheiro.

O aumento da base monetária não gera inflação de imediato na economia, esse processo é demorado, os fiduciários chamam-no de tempo de transmissão.

É um delay que existe, desde o momento em que se aplica uma mudança da política monetária e os seus efeitos a serem visíveis na economia real. Este delay pode variar entre 6 meses a 2 anos.

Observando o gráfico, a subida do IPC iniciou-se a Março de 2021, mas começou a acelerar 6 meses após, muito antes da guerra.

Se existe um delay na causa-efeito, logo a inflação é resultante de algo que aconteceu anteriormente, vamos ver o que aconteceu nos 2 anos anteriores.

Nesse período aconteceu a pandemia e o BCE efetuou o maior aumento da base monetária, desde a criação da moeda única. O início foi no primeiro trimestre de 2020 e a inflação (IPC) começou a subir no primeiro trimestre de 2021, mais ou menos um ano, correspondente ao intervalo de tempo do tempo de transmissão. A semelhança entre a impressão do banco central (EUCBBS, em azul) e o IPC (em azul)  é perfeita, apenas com um delay.

O BCE imprimiu (QE) ~4 triliões de euros, corresponde a um aumento de ~90% da base monetária(EUCBBS), no seu pico, em Setembro de 2022. Nesta mesma data, o IPC atingiu os 9%, o que levou o BCE a implementar medidas mais drásticas para combater a subida de preços, aplicou políticas de redução  de recompras de obrigações do Tesouro e a subida das taxas diretoras.

As políticas surtiram efeito, o EUCBBS teve uma correção, de 8.84 triliões para 6.36 triliões, mas se compararmos de 2020 a 2024, houve um aumento de 1.7 triliões, ~37%, ou seja, o EUCBBS não voltou aos valores anterior. 

Passados 2 anos após a guerra, os preços da energia e dos cereais, já baixaram, estão bastante abaixo do pico. Enquanto o EUCBBS está muito longe dos valores de 2020. Para que os produtos voltassem ao preço de 2021, o EUCBBS também necessitaria voltar para valores anteriores à guerra, mas isso nunca vai acontecer.

A inflação monetária não é temporária, é permanente.