Ethereum e afins

Eu já escrevi este artigo (parte significativa) há um mês, já o li e reli uma dezena de vezes, terminando sempre com a mesma dúvida: Publico ou não?

A ideia é tão díspar da realidade, existe uma forte probabilidade de não acontecer. A sensação ao ler isto é semelhante (na devida proporção) quando eu li o livro 1984, há mais ou menos 20 anos, a distopia era demasiado má. O mais curioso, passado 20 anos, a distopia do livro está cada vez mais real.

Eu prefiro errar redondamente ao publicar isto, do que me autocensurar.

Quando eu digo que reli uma dezena de vezes não significa que não acredite nisto, esta é a minha convicção. Qualquer coisa que eu escrevo é obrigatório reler várias vezes devido à minha forte dislexia. E cada vez que leio encontro novos erros, especialmente falta de palavras. É algo inexplicável a quantidade de palavras que eu “como” ao escrever. Depois eu consigo ler o texto e não encontro as falhas, por vezes “leio” as palavras como lá estivesse mas não estão. Eu reli umas 10 vezes e de certeza ainda tem erros. A minha escrita (tanto à mão, como no pc) não consegue acompanhar a velocidade do pensamento, existe uma enorme descoordenação entre os dois.

Este artigo é apenas a minha opinião, isto não é um aconselhamento de investimento, é apenas a minha ideia, a minha convicção, pelo qual eu me guio. Depois do disclaimer, vamos ao artigo…

São inúmeras as vezes que me questionam porque eu não gosto do Ethereum. A questão não é gostar ou não gostar, no meu ponto de vista o Ethereum e especialmente os seus tokens são muito Kitsch, uma parte significativa deles não faz qualquer sentido, até digo, chegam alguns a serem absurdos. Esta minha crítica não é exclusiva ao Ethereum, é a todas as blockchain irmãs que se baseiam em smartcontract.

Na maioria dos tokens, daqui uns anos, as pessoas que os compraram vão ter aquela sensação, que todos nós temos quando entramos nas nossas garagens ou arrumos e encontramos certos objetos que compramos no passado e perguntamos? Onde eu tinha a cabeça para comprar esta merda. Chegamos à conclusão que era a moda na época.

Uma ideia impregnada na comunidade altcoin, é pensar que a blockchain vai salvar o mundo, querem colocar tudo dentro de uma blockchain. Apenas estão a replicar o mundo FIAT em blockchain. A blockchain é o pior sistema de base de dados que existe, apenas é útil em uma situação, para ser descentralizado, tal como acontece no Bitcoin. Se todas são centralizadas, ou tem parte centralizada, não faz qualquer sentido ser uma blockchain, qualquer SQL é 1000 vez melhor. Para provar que a blockchain não é uma boa solução, foi necessário criar outras blockchain, sidechain e oráculos, para colmatar falhas da principal.

Eu não tenho dados concretos, mas é a minha convicção, 99% dos tokens existentes são estúpidos ou scams, resta 1% até tem algum valor. Mas este 1%, na qual toda a comunidade de altcoin tem uma expectativa de crescimento exponencial, por isso estão a investir na esperança de ficar ricos. O problema é que parte significativa deste 1%, poderá ter um forte revés no futuro próximo, estou a falar em 2 a 3 anos, é a minha convicção.

Regulamentação

Por volta de 2012 quando eu conheci o bitcoin, li o whitepaper, fiquei completamente fascinado, era uma obra de arte, a nível tecnológico era bom e foi melhorando ao longo do tempo mas o principal era a sua política monetária, esses são inalteráveis. Lembro-me perfeitamente, eu achar que o projecto poderia ser revolucionário, com consequências tremendas nas economias e nas políticas no mundo, era tão revolucionários que os políticos nunca iriam deixar crescer. Foi aqui o meu erro e claro dos políticos, os políticos não fizeram nada, foram incompetentes, deixaram crescer e crescer, agora é quase impossível parar. Mas não podemos nos desleixar porque eles têm muito poder e podem criar inúmeras limitações que poderão ter consequências dramáticas.

Será que os políticos vão voltar a cometer o mesmo erro?

Eu acredito que os políticos aprenderam a lição, desta vez estão conscientes, vão controlar o crescimento destas blockchains públicas. Desta vez os políticos já estão conscientes, sabem que a tecnologia pode ser disruptiva, não vão deixar crescer em “livre-arbitrio”.

O controle

A regulamentação vai cair em força em todo o ecossistema dos criptoactivos poderá levar de 2 a 3 anos, decapitando estas blockchains públicas.

Securities

Se o Ethereum for classificado com securities pelo SEC, será a primeira machadada no projecto. Eu não tenho qualquer dúvida que o é, e todas as outras, a única excepção é o bitcoin.

Stablecoin

Os governos não escondem, a sua prioridade é as stablecoins, vão regulamentar, eu até digo mais vão controlá-las. Como as CBDCs vão demorar a sua implementação, o FED vai controlar a USDC, USDT e as restantes. Como estes e todos os sintéticos são controlados por uma empresa que é centralizada, é muito fácil para governos controlar, pode nacionalizar a empresa, podem congelar os bonds e obrigar a empresa a cumprir as suas ordens.

Outra coisa que vai acontecer, mais dia menos dia é a obrigatoriedade do KYC, ou seja, só endereços com KYC podem ter stablecoins. Os endereços com stablecoin e sem KYC vão ser congelados (impossível de mover) até ser feito o KYC. Até poderá existir um valor mínimo, mas será bastante baixo.

NFTs

Os NFTs é a área que mais vai crescer, não tenho qualquer dúvida, mas não são os NFTs que surgiram na moda de 2021. Vão ser os verdadeiros NFT, os utilitários, os certificados de autenticidade. O NFTs não é um produto, mas sim uma “matéria prima”, é como o papel mas no mundo digital. Pode ser um livro, uma música, um bilhete, um certificado, infinitas possibilidades podem ser exploradas. Vamos explorar algumas ideias:

Acções e EFTs

Os tokens sintéticos de Ações ou EFT’s é o sonho molhado dos altcoiners, que vêm a sociedade toda tokenizada. Muito dificilmente isso vai acontecer, o mercado de ações e EFTs têm regras muito rigorosas, estas poderiam ser contornadas através deste tokens, por isso vão ser proibidas ou limitadas a endereços com KYC. Desde das limitações de percentagem de capital, insider trading, KYC, AML, entre outras.

No fim, nós chegamos sempre à mesma conclusão, qual a vantagem de comprar ações em blockchains públicas, porque não comprar diretamente na corretora, ainda temos a vantagem das suas mais valias.

Registo de Propriedade

Outro “sonho molhado”, o registo de imóveis, é outra área que dificilmente vai para blockchain livres, os governos não vão querer perder o controle directo ou indirecto (através dos notários).

O que poderá acontecer, até faz sentido, é o governo criar uma DLT própria, onde todos os notários podem adicionar os contratos. Eu tenho dúvida que seja possível fazer sem intermediário, primeiro o lobby do notários não vão querer, depois até faz sentido existir uma testemunha para evitar fraudes.

Isto leva-nos a outra questão, que eu acredito que vai acontecer no futuro, que é a disseminação do conteúdo por DLTs, ou seja, em vez de tudo centralizado em apenas uma blockchain, haverá inúmeras, divididos por categorias ou produtos ou países. Com o avançar da tecnologia, cada vez vai ser mais fácil criar uma DLT, vai acontecer algo como aconteceu com a criação do WordPress. Antigamente era complicado criar um site ou blog, actualmente basta meia dúzia de clicks e voilà. Mas estas DLTs não terão token nativo(moeda) ou então usam moedas já existentes, FIAT ou bitcoin. Apesar de não ter moedas própria, a rede cobrará uma pequena taxa para adicionar transação ou uma percentagens do valor da transação.

Os produtos mobiliários e imobiliários, que existem no mundo real, não podem ser descentralizados na sua plenitude. Como no caso das casas, imaginemos, caso haja uma burla no contrato de compra e venda, vai para tribunal e o juiz anula o contrato, como reverter isso numa blockchain totalmente descentralizada, simplesmente não dá.

Jogos

Os jogos e o play-to-earn foi outro scam de 2021, se pensarmos bem não faz qualquer sentido, os jogadores lucrarem com o jogo. Os jogos (comerciais) são criados para as pessoas gastarem dinheiro, ou através da compra do jogo ou através de microtransações ou por publicidade.

Ok, poderá existir um ou dois casos que resulte de sucesso, mas as grandes empresas de jogos não vão querer partilhar os lucros com os jogadores. Há anos, a Valve (criadora do CS-GO) disse que o maior erro foi terem permitido os jogadores venderem skins e armas nos mercados secundários, eles perderam biliões com isso. No caso da CS-GO ainda é pior, nem royalties tem.

Bilhetes

Os bilhetes e certificados de autenticidade é uma área que irá crescer muito, tenho muitas dúvidas que isto aconteça no Ethereum, talvez mais na Polygon. Este tipo de serviços, apenas pagará no máximo, fees de alguns cêntimos.

Diplomas

Os diplomas académicos é um conceito muito falado e faz todo o sentido estar em base de dados distribuídas, mas eu acredito que as universidades vão criar e gerir uma DLT própria para diplomas. 

Mundo Automóvel

Outro caso interessante é nos veículos motorizados, o ramo automóvel pode criar uma DLT própria. A base de dados seria para gerir toda a informação relacionada com os carros/motos, para criar mais transparência no mercado. Sempre que um carro vai a uma oficina, cada peça trocada o número de série terá que ser adicionada à db. As inspeções adicionaram os dados, assim podem ser controlados os kms, para evitar as fraudes. 

Assim antes de alguém comprar um carro, vai a db e vê todo o histórico, seria possível ver tudo.

DeFi e CeFi

O DeFi é uma área que não terá um crescimento exponencial nas blockchain atuais, vão crescer sim, mas DLTs criados pelos bancos (e outras instituições de crédito). Não sei se cada banco terá a sua ou então o BIS faz uma para todos as instituições, mas uma coisa é certa, não vão utilizar as blockchains públicas.

Os actuais DeFi baseia-se num criptoativo como garantia para o crédito, este sistema é impossível para a maioria da população, pelo menos de curto a médio prazo. A maior parte da população para um crédito dá como garantia um produto físico ( algum património ou o próprio produto que está a adquirir ) ou então tem um fiador ou os dois em simultâneo. Em todos os casos é necessário um intermediário (uma instituição de crédito) para o fazer a gestão, avaliação dos produtos e de risco. É por esse motivo técnico não acontecerá em blockchain públicas e também os governos preferem que isto continue nas instituições de crédito, por melhor controle.

DAOs

Na reunião do WEF em Davos deste ano, parece que só ali políticos tomaram conhecimento da existência das DAOs e suas consequências, veio a público que os políticos ficaram em alerta máximo. Nos próximos tempos os reguladores vão apertar o cerco.

As DAOs é outro problema crítico para os governos, tão ou mais crítico que o próprio bitcoin. Com as DAOs, os governos podem perder o controle das empresas e o seu poder de influência. 

As DAOs fazem todo o sentido estar em blockchain descentralizadas, mas os governos vão cair em cima destas organizações, apenas vão sobreviver aquelas que têm o seu negócio core dentro do ecossistemas da blockchain. 

Inovação

As actuais blockchains de smartcontract e de dapp, em termos de desenvolvimento ainda estão muito “verde”, ainda é tudo experimental. 

O Bitcoin com a criação da LN, atingiu a sua maturidade, o seu core business pouco mais pode ser melhorado. O que necessita de ser melhorado, é essencial na sua usabilidade, tornar mais fácil a sua utilização, mas isto acontece geralmente fora do core, em app externas ou layer 2 ou sidechain ou qualquer tecnologia que utilize a moeda btc. O real valor do bitcoin não está no código, mas sim na sua política monetária, na sua governança ( equilibrada através dos 3 poderes; os devs, os mineradores e os full nodes ), ideais morais e muita massa crítica. O código é apenas o veículo que permite que a política monetária seja exemplarmente cumprida e que garanta a segurança.

A Ethereum está actualmente à frente mas de um momento para o outro, pode surgir um novo projecto muito melhor, que resolveu os problemas do ETH. Este novo projecto poderá “roubar” o número utilizadores. Vamos ao exemplo dos NFTs, os contratos são iguais em todo o lado, os utilizadores estão a optar por sidechain porque é mais barato.

No caso do bitcoin os utilizadores têm uma ligação umbilical e moral com a moeda, tanto pode estar na main ou em layer 2 ou em outras blockchain, até mesmo num banco. A ligação é com a moeda e não com o código.

Isto não acontece com as outras blockchains, os utilizadores escolhem aquela que é mais barata, que lhe convém mais, onde podem ganhar/poupar mais dinheiro, ou seja, movem-se por interesse, pensam só no seu umbigo, pensamento FIAT. Se surgir uma blockchain melhor e mais barata ou custo zero as pessoas vão mudar, é como os supermercados, ou produtos são todos iguais, optam pela mais barata.

Política

A política monetária é extremamente importante, tem que ser moralmente correcta e previsível. Como podemos acreditar no Ethereum que ao longo da sua curta história já mudou diversas vezes a sua política monetária. Fez pré-mining, foi inflacionária, agora é deflacionária. Seguramente daqui algum tempo vão voltar a mudar, com tanta mudança é impossível pensar a longo prazo, quando falamos em moeda, a estabilidade é essencial.

Se é mau o FIAT ser controlado por políticos, mas estes ainda são eleitos por nós, apesar de pouco ainda temos algum poder sobre a moeda e sobre os políticos.

Mal por mal, prefiro estar subjugado a um político eleito do que na mão de um vitalik qualquer, com poder absoluto.

Em suma, os governos vão espremer as blockchains existentes com regulamentações, seguramente as blockchain publicas vão crescer muito, mas não existirá aquele crescimento exponencial, que muito estão à espera.

Como digo acima, isto é apenas a minha opinião, pode estar completamente errada.

Mesmo no caso que o Ethereum ultrapasse o bitcoin em marketcap, eu vou sempre preferir o Bitcoin, os seus ideais. Foram estes ideais que me trouxe para o bitcoin, de criar um mundo melhor, expresso na simples frase; Fix the Money, Fix the World; este é o seu verdadeiro valor, o preço em dólares é apenas um número, algo secundário.

Don’t Trust, Verify.