Bomba Relógio II

Como prometido no post sobre a dívida portuguesa, eu vou dar o meu ponto de vista, porque sou contra a reestruturação da dívida portuguesa, é aconselhável a sua leitura para um melhor entendimento.

“Group of 20 (G20) nations have some disagreements over restructuring debt for distressed economies, the chief of the International Monetary Fund (IMF) said on Saturday”  in Reuters

Com uma reestruturação da dívida irá provocar perdas significativas a quem está exposto à respetiva dívida.

Quem está exposto à Dívida?

  • 43% Banco de Portugal
  • 22% Residentes em Portugal
  • 8% Banco Central Europeu
  • 26% Não Residentes

Credores

Bancos

Só o Banco de Portugal detém 43%, mas não é só, porque os bancos comerciais também estão expostos, apenas tenho dados de 2020, corresponde a 8% do total dos ativos bancários. O problema não se limita aos bancos, os fundos de pensão estão na mesma posição.

“Há 123 anos que os investidores perdem dinheiro em obrigações do Tesouro” In ECO

Certificados de Aforro e Tesouro

Os portugueses comuns poderão ser fortemente penalizados, sobretudo agora, que aderiram em massa aos certificados de Aforro.

“Ao todo, o montante aplicado pelas famílias em certificados subiu 37.146 milhões de euros.” In Jornal de Negócios

Estado

O próprio estado também terá problemas, devido os CEDIC, onde organismos do estado compram dívida de curto prazo do próprio estado, corresponde a 20.796MM€. É um instrumento para tapar buracos de tesouraria no fecho dos anos.

FEFSS

“O FEFSS, criado em 1989, é um património autónomo gerido pelo Instituto de Gestão de Fundos de Capitalização da Segurança Social.

O seu grande objetivo é assegurar a estabilização financeira da Segurança Social, nomeadamente cobrindo as despesas previstas com pensões por um período mínimo de dois anos.” in doutorFinanças

Isto é pior de tudo, o governo (este e todos os anteriores) estão a utilizar o dinheiro das pensões para comprar dívida. Eu sabia que o fundo de pensões estava exposto à dívida pública, mas eu não esperava que a exposição fosse tão grande.

Regulamento de Gestão do FEFSS:

  • Investimentos restringidos a ativos com origem em Estados membros da União Europeia (UE) ou da OCDE denominados em qualquer moeda com curso legal nesses países;
  • Mínimo de 50% investido em títulos de dívida pública portuguesa ou outros garantidos pelo Estado Português;
  • Máximo de 40% investido em títulos representativos de dívida privada, excluindo depósitos, com a condição do rating não ser inferior a “BBB-/Baa3” ou equivalente (investment grade);
  • Máximo de 25% investido em ações ou ativos de idêntica natureza de sociedades anónimas negociáveis em mercados regulamentados;
  • Máximo de 10% investido em unidades de participação em fundos de investimento misto;
  • Máximo de 10% investido em ativos imobiliários;
  • Máximo de 5% investido em títulos que compõem a reserva estratégica;
  • Máximo de 15% de exposição, não coberta, a moeda estrangeira com curso legal em países da UE ou da OCDE.

Basta olhar para o regulamento para perceber o que está a acontecer, todos os itens tem um máxima, excepto um, como era de esperar, “Mínimo de 50% em títulos de dívida portuguesa

Vamos observar o relatório de contas 2021(pdf): 

O fundo está muito exposto à dívida portuguesa (51.53%) e também à dívida dos EUA (12.51%), que não está num bom momento.

Isto dá logo noção do que está a acontecer, o governo está a usar e abusar do Fundo de pensões para financiar o próprio governo. Esta semana mais um lote:

“Os 3.018,34 milhões de euros terão de ser transferidos pela Caixa Geral de Depósitos para a CGA na próxima sexta-feira. Esta última terá de aplicar o montante “na subscrição de uma carteira de Obrigações de Tesouro” in Eco

Se existir um perdão de dívida, parte significativa do fundo de pensões vai evaporar.

Para concluir, se existir uma reestruturação de dívida grande (50% ou mais), é provável que os Bancos e Fundos de Pensões terão que ser ajudados pelo próprio estado… onde o estado tem dinheiro para os salvar, possivelmente terá que fazer ainda mais dívida.

Assim dá para entender o que aconteceu na Grécia, houve vários perdões de dívida, mas a dívida deles ainda está maior. 

A exposição da economia portuguesa à dívida do país é demasiada, os governos estão a criar uma enorme bomba relógio, logo a reestruturação da dívida não é uma solução mas sim um novo problema.

A dívida portuguesa e o fundo de pensões são como dois ímanes, cada vez estão mais próximos, até que um momento, os dois vão mutuamente atrair, o impacto vai ser brutal e vão-se partir.

A única opção viável para os estados não colapsarem, é um longo período de inflação alta e juros baixos, destruindo as poupanças das pessoas.