Bomba Relógio

A dívida pública é uma bomba relógio, ela vai arrebentar, só não sabemos quando vai acontecer.

Vamos recordar uma mítica frase da política portuguesa:

“”Para pequenos países como Portugal e Espanha, pagar a dívida é uma ideia de criança. As dívidas dos Estados são por definição eternas. As dívidas gerem-se. Foi assim que eu estudei”, disse o ex-primeiro-ministro (José Sócrates) numa conferência em Paris com colegas universitários da Sciences Po, onde estuda Ciência Política.”  in Jornal de Negócios

Esta frase tem 3 peculiaridade:

  1. Pagar dívidas é coisa de crianças;
  2. As dívidas não se pagam, geram-se;
  3. E a pérola final, ”Foi assim que eu estudei”, todos nós sabemos como ele estudou.

Mas o grande problema, é que esta ideia, é cada vez mais dominante nos políticos, a rolagem de dívida, ou seja, gerar nova dívida para pagar a dívida anterior.

Vamos dissertar um pouco sobre a nossa dívida pública.

Politiquices

A dívida pública pode ter duas leituras, ou em percentagem do PIB ou valor nominal.

Os gráficos com linha castanha são do BdP, os dados estão atualizados mas apenas permite ver até 2018. Os gráficos com linha verde não estão atualizados, mas permite ver o longo histórico.

Valor Nominal

“Em comparação com o final de 2021, a dívida pública, na ótica de Maastricht, aumentou 3,3 mil milhões de euros. Esta subida resultou, em grande medida, das emissões líquidas positivas de certificados de aforro (7,2 mil milhões de euros), de obrigações e bilhetes do Tesouro (1,0 mil milhões de euros) e de outros depósitos junto do Tesouro (0,6 mil milhões de euros).

Em sentido contrário, destacaram-se as amortizações de obrigações do Tesouro de rendimento variável (-3,5 mil milhões de euros) e a redução de certificados do Tesouro (-2,6 mil milhões de euros).

Os ativos em depósitos das administrações públicas reduziram-se 1,6 mil milhões de euros. Deduzida desses depósitos, a dívida pública aumentou 4,9 mil milhões de euros, para 258,7 mil milhões de euros.”  in BdP.

Valor em relação ao PIB

“A dívida pública totalizava 114,7% do produto interno bruto (PIB) em 2022, o que representa uma redução de 10,9 pontos percentuais relativamente ao final do ano anterior.”  in BdP.

Os políticos adoram “manipular” os dados como lhe convém mas sem mentir, gostam muito de aproveitar a ideia do copo meio cheio ou meio vazio. E nisto, o nosso primeiro-ministro é mestre, apenas fala aquilo que lhe convém; é verdade que a dívida diminuiu para 114% do PIB… mas também é verdade que a dívida aumentou para quase 260 Mil Milhões de Euros, mas isto já não comentou publicamente.

A estatística do valor nominal é uma alta infinita…

Calendário de amortizações

A próxima década vai ser terrível, vamos analisar o relatório de IGCP de 2023, valores em mil milhões (MM). O IGCP já merecia um site novo, este deve ter sido criado no anos noventa 🙂

Nos próximos 9 anos, 7 deles são superiores a 15MM€ de dívida que tem que ser pago. 

Este gráfico dá uma perceção enganadora, dá a ideia que a partir de 2033, a dívida vai cair drasticamente, mas é uma questão de tempo, porque os próximos leilões de dívida vão cair nestes anos e as colunas vão subir. 

Para melhor exemplificar eu criei o seguinte gráfico, as barras pretas é o calendário do relatório de Janeiro de 2019 e a vermelho é o relatório de Janeiro de 2023 (gráfico anterior).

2024 foi o único ano em que a dívida diminuiu, houve pagamentos antecipados, ou seja, foi a única coluna que baixou. Mas é algo temporário, possivelmente vai aumentar este ano, o IGCP vai colocar títulos de dívidas de curto prazo. O pior é que a maioria das colunas aumentaram e muito. 

A coluna de 2033 não subiu, melhor dizendo, ainda não subiu, mas vai subir este ano, será para as Obrigações de Tesouro a 10 anos, no relatório do próximo ano vamos ver isso. 

Juros

As próximas amortizações e os respectivos juros.

O Governo já tem Obrigações do Tesouro para 2052, que absurdo… e o pior que já existe dívida para 2045 e 2037 com juros de 4.1%. Os juros das Obrigações que expiram em 2023 e 2024 são muito altos, 4.59% e 5.65%, respectivamente.

Até 2022 o governo beneficiou com a baixa de juros, na qual permitiu trocar dívida com juros altos por dívida com juros mais baixos. Só que agora os juros estão altos e ainda vai aumentar. A taxa de juros já superou os 3% e a crise ainda nem começou.

Composição da Dívida

Transacionável166.992
Bilhetes do Tesouro7.727
Obrigações do Tesouro156.492
Obrigações do Tesouro Rendimento Variável1.000
Medium Term Notes1.766
Não transacionável60.802
Certificados de Aforro19.626
Certificados do Tesouro15.243
CEDIC20.796
CEDIM786
Contas margem668
Outros3.683
Empréstimos oficiais56.322
Empréstimos SURE (UE)6.234
Empréstimos PRR (UE)960
Programa de Assistência Económica e Financeira49.128

Detentores de títulos de dívida

O maior detentor da dívida é o Banco de Portugal, com 43%, com um enorme crescimento nos últimos anos. 8% é do Banco Central Europeu e 26% é detido por estrangeiros. 

Também muito preocupante, é que 22% pertence a residentes em Portugal.

Os Certificados de Aforros são outro problema, devido à ilusão de juros altos, muitos portugueses optaram por estes produtos financeiros, onde existiu um forte crescimento.

Sim, é uma ilusão, porque os certificados dão +3% de juros mas a inflação é +8%, as pessoas estão a perder dinheiro. 

Espiral de Dívida

A dívida portuguesa está tão alta que está praticamente impagável. Existem 3 possibilidade para reduzir drasticamente o valor da dívida:

  1. Longo período de orçamentos de estado com superávit;
  2. Reestruturação de Dívida;
  3. Longo período com a taxa de inflação superior à taxa de juros, ou seja, inflação alta;

A primeira opção é quase impossível em Portugal, em democracia, apenas estivemos 1 ano com superávit e foi por pouco.

Assim a primeira opção está descartada, vamos à segunda, existe essa forte possibilidade, mas apenas será utilizada num caso extremo. No caso de Portugal a reestruturação seria mais prejudicial do que benéfica, provocaria danos terríveis para o país. No futuro próximo eu quero fazer um post a desenvolver este assunto.

Assim só resta a terceira opção, já é um consenso internacional que esta será a melhor solução para o excesso de endividamento dos países. Isto foi muito visível em 2022, onde o juros da banca ou Certificados de Aforro é muito inferior à inflação. Isto “funcionou” este ano, a dívida em relação ao PIB baixou, mas teve e tem um custo elevadíssimo para os portugueses, em especial dos mais pobres.

Mas os países podem entrar numa espiral da dívida, os bancos centrais vão imprimir dinheiro a rodos, para pagar dívida, gerando o efeito cantillon, destruindo as moedas e as poupanças das famílias.

Problema Global

Este problema não é exclusivo de Portugal, é algo global.

Para uma melhor comparação países, temos que olhar para a dívida em relação ao PIB e aqui, Portugal é o 16ª país mais endividado do mundo e 3ª na Europa. Nesta lista de 20 países, 5 são da Europa, bastante preocupante. A Grécia com quase 200% do PIB e o pior problema está na Itália, com 150% e é uma das principais economias da Zona Euro, será muito complexo se for necessário fazer os resgate financeiro.

A dívida dos EUA é assustadora e também é impagável, as grandes potências estão todas muito endividadas. A espiral da dívida será inevitável, nas próximas décadas, vai ser impresso tanto e tanto dinheiro.

O seguinte gráfico foi criado pelo próprio FED, é uma projeção da dívida pública, é uma alta infinita.

Mas analisando bem o gráfico, até está bem conservadora, o movimento é constante mas na realidade vai ser exponencial.

O calote dos EUA poderá estar próximo.

EDIT: No mesmo dia em que publiquei este post, foi dia de leilão de divida, foi mesmo coincidência.

“Nos títulos com maturidades a três meses a taxa de juro média implícita fixou-se nos 2,568% e nos títulos a 11 meses subiu para 2,975%.Os resultados na linha com maturidade em maio de 2023, onde foram colocados 450 milhões, compara com a taxa média de -0,302% conseguida a 15 de junho do ano passado, para um financiamento de 500 milhões de euros.

Na linha com maturidade em janeiro de 2024, onde foram colocados 300 milhões, os resultados desta quarta-feira comparam com a yield de 2,104%

O IGCP emitiu 1.000 milhões de euros em obrigações do Tesouro com uma maturidade de nove anos e meio, na semana passada. O custo também subiu, passando de 2,68% na emissão de junho de 2022 para 3,172%.” in Eco

Mais um lote de dívida, tanto a curto como a longo prazo. E este vai repetir várias este ano.